quarta-feira, 4 de abril de 2012

Cairo: a visita às Pirâmides requer precaução em um país em conflito mesmo pós-Mubarak


O Egito entrou no meu roteiro do mochilão do Oriente Médio meio de última hora. Eu estaria tão perto de lá e não poderia deixar de ver as Pirâmides, a única das Sete Maravilhas do Mundo Antigo ainda inteira atualmente. É um lugar histórico, místico e com uma imensa riqueza cultural. Mas nem tudo por lá é tão maravilhoso quanto se parece. Muito pelo contrário.
Depois de ser praticamente extorquido na imigração, cheguei ao Cairo com a cidade com toque de recolher. Era por volta das 6 horas da manhã e as ruas do centro estavam desertas, várias delas interditadas, carros carbonizados e o exército nas ruas. Sinais de guerra. Na noite anterior tinha acontecido um conflito entre cristãos que protestavam e militares, confusão que deixou mais de 20 mortos.
O Egito em geral tem muitos lugares a serem visitados, como o Monte Sinai, os templos de Luxor, os resorts de Sharm el-Sheikh no Mar Vermelho ou um cruzeiro pelo Rio Nilo. Mas o Cairo mesmo não possui tantos atrativos assim. Com exceção, claro, das Pirâmides, que ficam localizadas no subúrbio, na região de Gizé, o resto só vale a pena mesmo se o viajante estiver bastante disposto a aguentar algumas perturbações. Paciência e uma dose de precaução são os segredos.

Desde a queda do ditador Osni Mubarak, em janeiro de 2011, a situação do país permanece praticamente a mesma: um caos. A junta militar que comanda o país durante essa transição para um novo governo sofre resistência de boa parte da população, e uma solução não parece próxima de ser encontrada. Os protestos e confrontos entre manifestantes e polícia são frequentes por lá.
No entanto, nos três dias que fiquei na capital egípcia em outubro de 2011, não me senti em perigo em nenhum momento. Claro que é preciso ter cuidado, mas o viajante ou turista não é um alvo principal de violência. O problema social, de segurança, é interno, entre eles. Por outro lado, você se sente bastante incomodado com o assédio de vendedores ambulantes, desonestidade de taxistas (pegar um táxi é uma aventura, raros falam inglês) e chatos de plantão em outros serviços. É aquela sensação de que você está sendo passado para trás o tempo todo, levando gato por lebre. É preciso ficar alerta sempre. Mulheres devem ter um cuidado especial, evitando saírem sozinhas nas ruas e nunca usando roupas curtas, sempre respeitando a tradição islâmica. Mais uma vez, deixo claro que isso não é uma generalização. No meio da grande maioria de malandros, também encontrei pessoas do bem, preocupadas com a imagem do país, querendo ajudar os estrangeiros.

Mas vamos ao que interessa: as Pirâmides de Gizé. Elas ficam localizadas no subúrbio de Cairo, a cerca de 25 quilômetros ou pouco mais de meia hora do centro. Como nada é simples no Egito, a forma mais fácil de conhecer esta Maravilha do Mundo é fechar um tour diretamente no hotel ou em alguma agência de turismo, sempre barganhando bastante o preço, claro. Até existe um jeito mais barato de ir até lá, pegando mais de um ônibus, mas acho que a economia não vale o stress.
Além das três imponentes Pirâmides, Quéops, Quéfren e Miquerinos, a famosa Esfinge também fica no mesmo complexo, e o ingresso para tudo custa 60 pounds egípcios, ou 7 euros (estudante paga meia). Os monumentos, alguns construídos a mais de 2 mil anos antes de Cristo, são realmente espetaculares, históricos. Pagando um valor a mais, é possível entrar na maior das Pirâmides, Quéops, em alguns horários, apesar de o interior não ter atualmente nenhum atrativo além da mística ter sido no passado tumba de faraós. Os passeios de camelo por ali oferecidos pelos insistentes vendedores definitivamente não valem a pena, são claramente para pegar turista-trouxa.

No tour para Gizé, que pagamos acho que 180 pounds egípcios (pouco mais de 20 euros), fora os ingressos, também estava incluída a visita a Sakara, onde fica a Pirâmide de Djoser, ou pirâmide de degraus, localizada um pouco mais distante do centro da capital do Egito. No mesmo complexo existe um pequeno museu e ruínas de construções da antiguidade. O passeio inteiro, em um carro com um "motorista-guia", durou cerca de seis horas, de umas 9h da manhã até as 15h.
Na região mais central do Cairo, algumas atrações também ganham destaque, como o Museu Egípcio, repleto de itens que contam a história desta civilização, e a Praça Tahrir, palco das revoluções que derrubaram Mubarak. No bairro islâmico, uma visita certa é o Bazar Khan Al-Khalili, que, assim como nos outros países árabes, vende de tudo o que se possa imaginar (mas aí lembre-se da história de pechinchar os preços e do gato por lebre).

Também existem inúmeras mesquitas na cidade, com a Amr Inb Ass ou a Al-Azhar. Ali perto, numa parte um pouco mais alta, fica um dos pontos turísticos mais visitados, a Citadel of Salah Al-Din, que já foi sede do governo e onde fica a mesquita de Mohammed Ali. Na parte mais antiga da capital, é possível observar um pouco do contraste da cultura muçulmana com monumentos e igrejas cristãs e coptas. Já o bairro de Zamalek é onde ficam prédios residenciais e comerciais mais novos, de um padrão financeiro mais alto. E, claro, o Rio Nilo corta a cidade, apesar de que os passeios mais interessantes são navegando rumo ao sul do país.
Outro lado bom do Cairo é o custo, hoteis e restaurantes são bem baratos em geral. Fiquei no hotel Sara Inn, simples mais bem no centro, pagando 60 pounds egípcios (7 euros) por pessoa em um quarto duplo, com banheiro compartilhado. Mas certamente havia opções com preços ainda menores.

Antes de encerrar, vale um alerta quanto à entrada no país. É necessário visto para brasileiros, que pode ser tirado ainda no Brasil. Fui informado que eu poderia conseguir na embaixada egípcia em Israel (eu estava vindo de lá no mochilão) no mesmo dia que fizesse o pedido. Porém, chegando ao local em Tel Aviv, me falaram que demoraria três dias para ficar pronto. Como eu não tinha tempo para esperar, a casa não caiu por muito pouco. Através de uma agência de turismo credenciada, consegui o visto na hora, na fronteira mesmo, entre as cidades de Eilat e Taba, mas tive que pagar um preço bem mais alto pelo serviço. Certamente fomos extorquidos pelos larápios, até tentamos discutir, mas não tínhamos muita opção na hora. Era cerca de 1h da manhã quando cruzamos a fronteira, e pegamos uma van com direito a um segurança do exército junto para poder cruzar o deserto do Sinai, onde existem constantes ataques de beduínos. Depois de mais de 5 horas de viagem, chegamos ao Cairo.
Incômodos e aventuras à parte, conhecer a capital do Egito é vivenciar e ver com os próprios olhos um pouco daquilo que tanto ouvimos durante as aulas de história na escola. Só a visita às pirâmides já compensa qualquer outro problema que, infelizmente, é preciso enfrentar pela situação que o país atravessa.

Legendas: 1) A Grande Pirâmide de Quéops e a Esfinge - 2) Pirâmides de Quéops, Quéfren e a Esfinge - 3) O Museu Egípcio - 4) Mesquita de Mohammed Ali, na Citadel - 5) Rio Nilo no centro do Cairo - 6) Pirâmide de degraus, em Sakara

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Mais Israel: praias e baladas em Tel Aviv, o Yom Kippur, flutuação no Mar Morto e exército nas ruas


Tel Aviv é conhecida como uma das cidades que abriga as melhores baladas de música eletrônica do mundo. Além disso, conta com boas praias e um contagiante clima de litoral. Tudo isso unido à beleza das mulheres israelenses já citada no post anterior. Sabendo desta fama da cidade, programamos para estar por lá durante dois dias, sexta-feira e sábado, dias mais agitados para sair à noite. O planejamento quase deu certo. Quase. O “tal” do Yom Kippur não estava nos nossos planos. Estávamos em Tel Aviv no único dia do ano que realmente nada funciona. E isso, claro, também, vale para bares e baladas.
O Yom Kippur é o dia mais sagrado do ano para os judeus, é o feriado do dia do perdão, no qual eles ficam durante 25 horas em jejum e rezando intensamente. Neste período, que começa no pôr do sol do dia que antecede à data oficial, os judeus não podem trabalhar, comer, beber, usar a eletricidade, tomar banho, dirigir, fazer sexo, entre outras coisas. Ou seja, a cidade para, o país para.

Fomos de van de Jerusalém para Tel Aviv, em uma viagem de cerca de 1 hora e meia. Ficamos no hostel Hayarkon 48, uma excelente opção, apesar de ser um pouco mais caro (98 shekels ou 20 euros a diária). Chegamos ao hostel por volta das 16h30 completamente desavisados sobre o feriado, e só caímos na real quando o cara da recepção nos explicou a dimensão do que estava acontecendo. A primeira reação nossa foi de total frustração, sabendo que perderíamos as tão esperadas baladas. Porém, a oportunidade de vivenciar uma data tão importante para Israel e o clima mochileiro e festivo do hostel transformou a nossa decepção inicial em um momento marcante.
Antes mesmo de fazer o check-in, tivemos que correr em um mercado próximo para fazer compras de comida (já que tudo na cidade estaria fechado em poucos minutos) e, claro, fazer um estoque de bebidas também. Sem ter o que fazer na rua, a festa à noite aconteceu no terraço a céu aberto no topo do hostel, com viajantes de diversas partes do mundo, com direito a música, muita vodka, whisky e cerveja, e aquele clima internacional descontraído que só bons hostels podem oferecer.

No dia seguinte, sábado 8 de outubro de 2011, data do feriado de fato, as ruas de Tel Aviv seguiam vazias, sem nenhum movimento de carro e comércios fechados, apenas com ciclistas e pedestres dominando o espaço. Com isso, a grande atração da cidade eram mesmo as praias, sempre repletas de uma mulherada bem interessante e com uma bela vista para o Mar Mediterrâneo. Os estilo das pessoas da cidade é mais descontraído mesmo, você observa bem menos judeus ortodoxos, por exemplo.
Na orla do centro da cidade (que guardadas as devidas proporções lembra bastante o Rio de Janeiro), com grandes hotéis de luxo, ficam as praias de Aviv, Ge’la, Yerushalaym, Trumpeldor, Frishman, Gordon e Bundolo, todas acessíveis com uma caminhada. Em dias normais, quando os bares estão abertos e com música, o movimento é ainda melhor. Mais a Norte da cidade, indo em direção ao porto, fica a praia de Nordau, reservada para judeus ortodoxos, onde em determinados dias da semana só entram mulheres e em outros apenas homens.
Mais a Sul, fica a Cidade Velha de Jaffa, que conta com bons bares e restaurantes. Existem também alguns museus e sinagogas por lá, por exemplo, mas a viagem a Tel Aviv vale mesmo muito mais para se divertir e/ou relaxar aproveitando o clima litorâneo.
Após o pôr do sol de sábado, quando acaba o Yom Kippur, parte da vida por lá volta ao normal. Com isso, conseguimos aproveitar para ir a alguns bares e baladas menores, comprovando a fama da boa vida noturna de Tel Aviv. No domingo pela manhã, pegamos um ônibus de lá para Eilat, por 75 shekels (15 euros) e cinco horas de duração, e depois seguimos viagem para o Egito.

Entrada em Israel – Existem três pontos na fronteira para entrar em Israel vindo da Jordânia, que era o nosso caso. Vale lembrar que, apesar de Israel também estar ao lado de Líbano e Síria, não existe fronteira aberta com esses países devido aos conflitos. Ao Sul, existe um acordo com o Egito e pode-se cruzar a borda em um ponto.
Fizemos a travessia na fronteira Yitzhak Rabin/Wadi Araba, vindo de Aqaba (Jordânia) e entrando em Eilat, Sul de Israel. Chegamos bem cedo e estava bem vazio, o que acelerou nosso tempo na imigração. Mesmo assim, demoramos pouco mais de meia hora para fazer todo o processo, que é bem rígido. Como tínhamos carimbos de Síria e Líbano no passaporte, a oficial fez diversas perguntas em entrevistas individuais em uma sala fechada. Tudo por questão de segurança, temor ao terrorismo, devido às constantes guerras com os inimigos árabes. No caso do Chuck, a preocupação deles foi com o sobrenome alemão. Depois de comprovarmos que éramos humildes viajantes mochileiros, recebemos o visto de entrada no país. Não pagamos nada na fronteira, mas na saída de Israel é cobrado uma taxa de 68 shekels (14 euros).
Dizem que na travessia que fica mais próxima a Jerusalém e Amam o controle de imigração é ainda mais chato, com pessoas que frequentemente esperam por duas horas pelo processo inteiro.
Vale ressaltar que, apesar das perguntas, é possível entrar em Israel com o carimbo de Síria e Líbano no passaporte, mas o caminho inverso não pode ser feito. Além destes dois, outros países árabes impedem a entrada de qualquer pessoa que já tenha visitado Israel, mesmo sendo apenas a turismo.

Mar Morto – Entrando no país logo pela manhã, antes de seguirmos para Jerusalém, passamos para conhecer o Mar Morto, o ponto na Terra mais abaixo do nível do mar (-423 metros), que fica na divisa entre Israel em Jordânia. Pegamos um ônibus da companhia Egged em Eilat (45 shekels ou 9 euros) e depois de cerca de três horas chegamos a Ein Gedi, um dos mais tradicionais pontos para se visitar o Mar Morto. Existem também diversos outros ao longo da costa.
Apesar de ser uma “praia”, não pense que você vai encontrar uma praia de verdade por lá. Até rola tomar sol, mas ao invés de areia, existe uma pequena faixa de pedras. Mas o interessante mesmo é entrar no mar e ficar flutuando. Devido ao excesso de concentração de sal na água (dez vezes maior do que nos demais oceanos) e à densidade, você acaba boiando o seu corpo inteiro involuntariamente. O simples fato de ficar com os pés dentro do mar e a cabeça para fora se torna uma tarefa difícil. De fato, é uma experiência única. A recomendação é para não ficar mais de 15 minutos direto dentro da água. Outra atração do local é passar no corpo a lama de lá, que contém minerais e dizem fazer bem para a saúde. Para fazer tudo isso na praia, obviamente é de graça, mas paga-se se quiser ir a uma reserva natural que existe nas proximidades. Saindo de Ein Gedi, pegamos um ônibus no mesmo dia no final da tarde para Jerusalém.

Impressões gerais – Gostei bastante de Israel, me surpreendi de forma positiva e voltaria facilmente para lá. Depois de ter passado por diversos países árabes, a comparação vira até covardia. Apesar de também ser impossível entender e ler a língua hebraica, a maioria dos israelenses fala inglês e a sinalização nas ruas também usa os dois idiomas.
Apesar de todos os problemas políticos e das guerras, o país é bastante desenvolvido, o povo é educado e acostumado a receber turistas. A mulherada então é sensacional, como já escrevi algumas vezes aqui. Claro, não se pode generalizar, mas a maior parte é assim. Em relação ao resto do Oriente Médio, Israel é uma região bem cara, com o custo para um viajante (hospedagem, alimentação, transporte, baladas) bem perto ao da Europa.
Mas, apesar das semelhanças com países ocidentais, existem também muitas diferenças e situações que estamos pouco acostumados a presenciar por aqui. A principal delas é quanto à segurança e a preocupação deles com terrorismo e guerras. É impressionante o número de militares do exército (ah, as militares israelenses) espalhados pelas ruas. Você vê metralhadoras frequentemente da mesma forma que você vê guarda-chuvas na chuvosa Londres. Aconteceu de eu estar sentado em um ônibus ou em uma lanchonete e um cara sentar ao meu lado com uma dessas metrancas penduradas no pescoço. Lá é a coisa mais normal do mundo. Também vi vários caças voando pelo céu e mísseis perto da fronteira em Eilat apontados para algum inimigo (imaginei que fosse para Gaza ou para o Egito, pela proximidade). Sem falar nos inúmeros detectores de metais e raios-x nas entradas de qualquer prédio público, rodoviária, shopping e coisas do tipo. Para se ter uma ideia da importância do serviço militar em Israel, aos 18 anos todos no país são obrigados a se apresentar e a servir. Homens são recrutados e ficam por três anos e mulheres servem durante dois anos. Só existem raras dispensas em casos excepcionais, se a pessoa não for apta física ou mentalmente.
Os costumes judaicos e de parte da população local são outra coisa que chamam a atenção, mas também não é nada de outro planeta. Vende-se bebida alcoólica e qualquer lugar, narguilé é um hábito no país e restaurantes que servem alimentos kosher (preparados de acordo com a tradição dos judeus, sem a mistura de carne e leite, por exemplo), incluindo alguns McDonald's estão por todas as partes.
Bom, pelo tamanho destes dois posts sobre Israel já dá para ter uma boa noção de quanta coisa interessante o país pode oferecer. Isso porque não tive tempo de ir para lugares como Nazaré, Jericó, Haifa e o Mar da Galileia. Porém fiz uma visita obrigatória à Palestina, mais precisamente a Belém, na Cisjordânia, experiência que será relatada no próximo post.

Legendas: 1) Pôr do sol espectacular em Tel Aviv, com o Mar Mediterrâneo ao fundo - 2) Ruas desertas, sem carro, durante o Yom Kippur na avenida da praia em Tel Aviv - 3)Orla central de Tel Aviv, com praias como Frishman e Gordon beach - 4) Praia em Tel Aviv - 5) Mar Morto visto do lado de Israel, com pessoas flutuando, e a Jordânia do outro lado da costa - 6) Ein Gedi, uma das principais praias do Mar Morto do lado de Israel

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Jerusalém: a cidade sagrada para cristãos, judeus e muçulmanos mistura tranquilidade e agitação

Imagine um lugar onde muçulmanos, cristãos e judeus convivem juntos em uma área de 1 quilômetro quadrado. Agora imagine um lugar onde Jesus Cristo, Maomé e Abraão viveram momentos que construíram a história de suas religiões. Imagine ainda que neste mesmo lugar existem militares “desfilando” normalmente nas ruas com metralhadoras penduradas no pescoço. E pense que boa parte dessas militares são mulheres e gostosas. Calma, não acabou. Ao mesmo tempo que existem lugares sagrados e calmos nesta cidade, há muito agito noturno, bares e baladas. E as tais mulheres militares vão pra essas baladas à noite (sem as metralhadoras, claro). Bom, mas mesmo sem as armas, elas gostam de guerra. É, esse lugar existe e se chama Jerusalém. Então, pare de imaginar e dê um jeito de viajar pra lá.
Conflitos políticos e religiosos à parte, a capital de Israel (ou da Palestina? Mas isso será relatado em outro post) é um dos lugares mais intrigantes e interessantes do mundo. Fui para lá em outubro de 2011, durante o mochilão que fiz pelo Oriente Médio. E é justamente essa mistura maluca de culturas que torna o lugar extremamente sensacional e, por sinal, bastante turístico.

Entramos em Israel vindo da Jordânia, pelo Sul do país, e passamos pelo Mar Morto antes de chegar a Jerusalém. Ficamos no Citadel Youth Hostel, na Old City, por três noites (por 60 shekels ou 12 euros a diária), sendo que a primeira delas dormimos no roof, sótão a céu aberto. Boa opção, local com vários mochileiros dividindo histórias. Eu diria que três dias é o mínimo de tempo para se ficar por lá. Tem bastante coisa para ver.
Para conhecer a Old City, nos juntamos a um tour gratuito comum também em algumas cidades da Europa, que durou cerca de três horas e percorreu os principais pontos turísticos (Não sou muito fã de tours guiados, mas neste caso foi uma boa. Além de ter que pagar apenas se quiser e quanto quiser, o guia deu uma explicação resumida dos lugares e mostrou vários pontos que só quem é de lá mesmo conhece. Foi bom para ter uma boa noção da cidade, e depois voltar por conta nos lugares mais interessantes). Vale citar que todas as principais atrações da Old City são gratuitas e podem ser conhecidas a pé.
A Cidade Velha é dividida em quatro bairros: o cristão, o muçulmano, o judeu e o armênio, cada um com suas peculiaridades. A circulação entre os bairros é livre e apenas para pedestres, que se perdem no labirinto deixando a imaginação voltar à vida de milhares de anos atrás. Espalhadas pelas ruelas e becos estão diversas pequenas lojas que vendem souvenirs, produtos e comidas típicas de cada um destes povos, além, é claro, de contar com templos históricos. A região de 1 quilômetro quadrado é rodeada por muralhas, e existem atualmente sete portões de entrada.

Um dos principais acessos é o Jaffa Gate, onde fica o Museu Torre de David. De lá, começa a David Street, que leva aos principais lugares do bairro cristão e se estende até a entrada da Praça do Muro Ocidental. Mas a principal atração desta região é mesmo a Igreja do Santo Sepulcro (Church of Holy Sepulchre), local onde os católicos acreditam que aconteceu a crucificação e a ressurreição de Jesus Cristo.
O bairro muçulmano, que tem como principal porta de entrada o Damascus Gate, é o que abriga a maior população da Old City. Depois de passar alguns dias em países árabes do Oriente Médio, basta uma volta nesta região para relembrar os principais costumes islâmicos e os sons das mesquitas. Apesar de a região ser atualmente muçulmana, é lá que se localiza a Via Dolorosa. De acordo com a crença cristã, foi por este caminho que Jesus fez a Via Crucis, carregando a cruz até morrer.
Já no bairro judeu, o mais rico e com casas mais bem cuidadas, estão diversas sinagogas, como a Hurva, e também o Cardo, um sítio arqueológico descoberto após escavações. Mas o cartão postal da região é o famoso Muro Ocidental (Western Wall), mais conhecido como o Muro das Lamentações. É o local mais sagrado para o judaísmo, único vestígio do antigo Templo de Herodes, destruído em uma das inúmeras batalhas em Jerusalém. Mas lá, além de judeus ortodoxos rezando durante o dia inteiro, também estão turistas (que são obrigados a usar um quipá na cabeça) colocando entre as pedras do muro bilhetea de papel com pedidos e agradecimentos. Para entrar na praça onde fica o muro, é necessário passar por um detector de metais, antes de chegar ao local frequentemente lotado de viajantes e moradores locais dos mais diferenciados tipos e culturas.
O menor e menos atrativo, mas não menos importante, dos bairros é o armênio. Lá fica a St. James Cathedral. Aí vem a pergunta: por que armênio e não russo, japonês, inglês, americano, etc..? Porque a Armênia foi o primeiro país do mundo a aceitar a religião cristã.

Para finalizar as atrações da Cidade Velha, deixei por último o Temple Mount (Monte do Templo), talvez a mais famosa e “curiosa” das atrações. Lá fica o Dome of the Rock (Cúpula da Rocha), tradicional mesquita com a cúpula dourada. O local é o terceiro mais sagrado do planeta para o islamismo, ficando atrás apenas de Meca e Medina. Mas espera aí, como que pode existir um lugar tão importante para os muçulmanos dentro de um país predominantemente judaico e também sagrado para os cristãos. Pois é, às vezes é difícil de imaginar. Eu mesmo não sabia de diversos interessantes detalhes do que acontece por lá. Neste mesmo local, teriam acontecido momentos históricos para três religiões distintas. Para os muçulmanos, foi a partir dali que Maomé teria subido ao céu. Para os judeus, foi onde Abraão teria oferecido seu filho Isaac ao sacrifício. Para os cristãos, foi onde Caim teria matado o irmão Abel.
Depois de muitas disputas, guerras e domínios, quem controla hoje o Temple Mount são os muçulmanos. A entrada para qualquer pessoa não muçulmana (de qualquer outra religião, seja turista ou morador local) só é permitida em restritos horários durante o dia e nunca nas sextas-feiras, sábados e feriados. O controle de acesso é rígido, com militares armados, revista rigorosa, raio-x e é necessário se vestir discretamente (nada de bermudas ou saias curtas).

Lá dentro, além do imponente Dome of the Rock, também fica a Mesquita de Al-Aqsa, mas apenas muçulmanos podem conhecer o interior delas. De qualquer forma, vale bastante a visita por toda a praça, pela área verde do complexo e pela energia do local.
Apesar de tantos lugares a serem visitados na Old City, Jerusalém ainda tem muita coisa a oferecer foras das muralhas. O Monte das Oliveiras, por exemplo, conta com diversas igrejas, a Tumba de Vigem Maria e foi onde Jesus teria feito alguns de seus ensinamentos. No Monte Zion, estão a Tumba do Rei David e o túmulo de Oskar Schindler. Na Cidade Nova, ficam o tradicional Mercado de Mahane Yehuda e o bairro de Mea She`arim, onde se concentram os judeus ortodoxos, sempre vestidos todos de preto, com chapéu e barba longa. Claro, ainda existem na cidade muitos outros museus, igrejas, sinagogas e mesquitas, que podem ser visitadas de acordo com o gosto específico de cada um.

Mas como citado no início do post, Jerusalém também oferece muita diversão para o viajante. Na New City, nas travessas da Jaffa Road e perto da Zion Square estão diversos bares que ficam lotados de jovens durante a noite. A cidade é de fato vibrante, com diversas opções de lazer. E também existem boas baladas que rolam até o amanhecer. Fui à HaOman 17, que fica a uns 15 minutos de táxi do centro. Lugar grande, com música eletrônica e comercial, lotado de mulher, era um dos nightclubs que estava pegando na época. E por falar em mulherada, Israel me surpreendeu positivamente neste sentido. Impressionante o nível das israelenses. O exército do país é sacanagem, as minas “desfilam” beleza vestidas de militar e com uma metralhadora pendurada no pescoço durante o dia. E, à noite, essas mesmas militares estão nas baladas. De fato, elas querem guerra.
Nos posts seguintes, ainda vou escrever mais sobre os conflitos entre Israel e Palestina, a segurança por lá, costumes e curiosidades da região, e também relatos sobre deslocamentos dentro do país, imigração e informações gerais. Além, de Jerusalém, visitei o Mar Morto, Tel Aviv e Belém, lugares bem diferentes um do outro.
Independentemente de sua religião ou intensidade de sua fé, é até difícil descrever a sensação de estar em uma terra santa como esta. Ir a Jerusalém é ver a história do mundo de perto e com os próprios olhos, em determinados momentos até se sentido um pouco parte desta história. Seja você cristão, judeu, muçulmano ou até mesmo ateu, a capital de Israel certamente é um dos destinos mais espetaculares do planeta para se conhecer.

Legendas: 1) Dome of the Rock (Cúpula da Rocha), no Temple Mount - 2) Muro das Lamentações ou Muro Ocidental - 3) Igreja do Santo Sepulcro - 4) David Street, com comércio típico, do bairro cristão da Old City - 5) Vista panorâmica da Old City, a partir do hostel, com Dome of the Rock e Monte das Oliveiras ao fundo - 6) Espetaculares militares israelenses em Jerusalém