quarta-feira, 4 de abril de 2012

Cairo: a visita às Pirâmides requer precaução em um país em conflito mesmo pós-Mubarak


O Egito entrou no meu roteiro do mochilão do Oriente Médio meio de última hora. Eu estaria tão perto de lá e não poderia deixar de ver as Pirâmides, a única das Sete Maravilhas do Mundo Antigo ainda inteira atualmente. É um lugar histórico, místico e com uma imensa riqueza cultural. Mas nem tudo por lá é tão maravilhoso quanto se parece. Muito pelo contrário.
Depois de ser praticamente extorquido na imigração, cheguei ao Cairo com a cidade com toque de recolher. Era por volta das 6 horas da manhã e as ruas do centro estavam desertas, várias delas interditadas, carros carbonizados e o exército nas ruas. Sinais de guerra. Na noite anterior tinha acontecido um conflito entre cristãos que protestavam e militares, confusão que deixou mais de 20 mortos.
O Egito em geral tem muitos lugares a serem visitados, como o Monte Sinai, os templos de Luxor, os resorts de Sharm el-Sheikh no Mar Vermelho ou um cruzeiro pelo Rio Nilo. Mas o Cairo mesmo não possui tantos atrativos assim. Com exceção, claro, das Pirâmides, que ficam localizadas no subúrbio, na região de Gizé, o resto só vale a pena mesmo se o viajante estiver bastante disposto a aguentar algumas perturbações. Paciência e uma dose de precaução são os segredos.

Desde a queda do ditador Osni Mubarak, em janeiro de 2011, a situação do país permanece praticamente a mesma: um caos. A junta militar que comanda o país durante essa transição para um novo governo sofre resistência de boa parte da população, e uma solução não parece próxima de ser encontrada. Os protestos e confrontos entre manifestantes e polícia são frequentes por lá.
No entanto, nos três dias que fiquei na capital egípcia em outubro de 2011, não me senti em perigo em nenhum momento. Claro que é preciso ter cuidado, mas o viajante ou turista não é um alvo principal de violência. O problema social, de segurança, é interno, entre eles. Por outro lado, você se sente bastante incomodado com o assédio de vendedores ambulantes, desonestidade de taxistas (pegar um táxi é uma aventura, raros falam inglês) e chatos de plantão em outros serviços. É aquela sensação de que você está sendo passado para trás o tempo todo, levando gato por lebre. É preciso ficar alerta sempre. Mulheres devem ter um cuidado especial, evitando saírem sozinhas nas ruas e nunca usando roupas curtas, sempre respeitando a tradição islâmica. Mais uma vez, deixo claro que isso não é uma generalização. No meio da grande maioria de malandros, também encontrei pessoas do bem, preocupadas com a imagem do país, querendo ajudar os estrangeiros.

Mas vamos ao que interessa: as Pirâmides de Gizé. Elas ficam localizadas no subúrbio de Cairo, a cerca de 25 quilômetros ou pouco mais de meia hora do centro. Como nada é simples no Egito, a forma mais fácil de conhecer esta Maravilha do Mundo é fechar um tour diretamente no hotel ou em alguma agência de turismo, sempre barganhando bastante o preço, claro. Até existe um jeito mais barato de ir até lá, pegando mais de um ônibus, mas acho que a economia não vale o stress.
Além das três imponentes Pirâmides, Quéops, Quéfren e Miquerinos, a famosa Esfinge também fica no mesmo complexo, e o ingresso para tudo custa 60 pounds egípcios, ou 7 euros (estudante paga meia). Os monumentos, alguns construídos a mais de 2 mil anos antes de Cristo, são realmente espetaculares, históricos. Pagando um valor a mais, é possível entrar na maior das Pirâmides, Quéops, em alguns horários, apesar de o interior não ter atualmente nenhum atrativo além da mística ter sido no passado tumba de faraós. Os passeios de camelo por ali oferecidos pelos insistentes vendedores definitivamente não valem a pena, são claramente para pegar turista-trouxa.

No tour para Gizé, que pagamos acho que 180 pounds egípcios (pouco mais de 20 euros), fora os ingressos, também estava incluída a visita a Sakara, onde fica a Pirâmide de Djoser, ou pirâmide de degraus, localizada um pouco mais distante do centro da capital do Egito. No mesmo complexo existe um pequeno museu e ruínas de construções da antiguidade. O passeio inteiro, em um carro com um "motorista-guia", durou cerca de seis horas, de umas 9h da manhã até as 15h.
Na região mais central do Cairo, algumas atrações também ganham destaque, como o Museu Egípcio, repleto de itens que contam a história desta civilização, e a Praça Tahrir, palco das revoluções que derrubaram Mubarak. No bairro islâmico, uma visita certa é o Bazar Khan Al-Khalili, que, assim como nos outros países árabes, vende de tudo o que se possa imaginar (mas aí lembre-se da história de pechinchar os preços e do gato por lebre).

Também existem inúmeras mesquitas na cidade, com a Amr Inb Ass ou a Al-Azhar. Ali perto, numa parte um pouco mais alta, fica um dos pontos turísticos mais visitados, a Citadel of Salah Al-Din, que já foi sede do governo e onde fica a mesquita de Mohammed Ali. Na parte mais antiga da capital, é possível observar um pouco do contraste da cultura muçulmana com monumentos e igrejas cristãs e coptas. Já o bairro de Zamalek é onde ficam prédios residenciais e comerciais mais novos, de um padrão financeiro mais alto. E, claro, o Rio Nilo corta a cidade, apesar de que os passeios mais interessantes são navegando rumo ao sul do país.
Outro lado bom do Cairo é o custo, hoteis e restaurantes são bem baratos em geral. Fiquei no hotel Sara Inn, simples mais bem no centro, pagando 60 pounds egípcios (7 euros) por pessoa em um quarto duplo, com banheiro compartilhado. Mas certamente havia opções com preços ainda menores.

Antes de encerrar, vale um alerta quanto à entrada no país. É necessário visto para brasileiros, que pode ser tirado ainda no Brasil. Fui informado que eu poderia conseguir na embaixada egípcia em Israel (eu estava vindo de lá no mochilão) no mesmo dia que fizesse o pedido. Porém, chegando ao local em Tel Aviv, me falaram que demoraria três dias para ficar pronto. Como eu não tinha tempo para esperar, a casa não caiu por muito pouco. Através de uma agência de turismo credenciada, consegui o visto na hora, na fronteira mesmo, entre as cidades de Eilat e Taba, mas tive que pagar um preço bem mais alto pelo serviço. Certamente fomos extorquidos pelos larápios, até tentamos discutir, mas não tínhamos muita opção na hora. Era cerca de 1h da manhã quando cruzamos a fronteira, e pegamos uma van com direito a um segurança do exército junto para poder cruzar o deserto do Sinai, onde existem constantes ataques de beduínos. Depois de mais de 5 horas de viagem, chegamos ao Cairo.
Incômodos e aventuras à parte, conhecer a capital do Egito é vivenciar e ver com os próprios olhos um pouco daquilo que tanto ouvimos durante as aulas de história na escola. Só a visita às pirâmides já compensa qualquer outro problema que, infelizmente, é preciso enfrentar pela situação que o país atravessa.

Legendas: 1) A Grande Pirâmide de Quéops e a Esfinge - 2) Pirâmides de Quéops, Quéfren e a Esfinge - 3) O Museu Egípcio - 4) Mesquita de Mohammed Ali, na Citadel - 5) Rio Nilo no centro do Cairo - 6) Pirâmide de degraus, em Sakara